O Que Acontece com o Militar Réu em Processo Criminal?
A vida militar é regida por um conjunto de leis e regulamentos próprios, que estabelecem deveres e proibições específicos para seus membros. Quando um militar se torna réu em um processo criminal, seja na Justiça Militar ou na Justiça Comum, a situação desencadeia uma série de impactos e procedimentos que afetam diretamente sua carreira, rotina e até mesmo sua liberdade. Diferente do civil, o militar réu enfrenta consequências que podem ir além da esfera penal, atingindo sua situação funcional dentro da corporação.
A hierarquia e a disciplina, pilares das Forças Armadas e das Polícias e Bombeiros Militares, exigem que a conduta de seus integrantes seja sempre irrepreensível. Um processo criminal, mesmo que ainda não tenha resultado em condenação, já levanta dúvidas sobre a aptidão do militar para continuar exercendo suas funções. Por isso, as instituições militares possuem mecanismos para lidar com essas situações, que podem variar de um simples monitoramento a medidas mais drásticas como o afastamento do cargo ou a prisão preventiva.
Neste artigo, vamos detalhar as consequências jurídicas e administrativas para o militar que se torna réu em um processo criminal. Abordaremos se o processo criminal suspende a carreira militar, as possibilidades de afastamento do cargo ou prisão preventiva, os reflexos na promoção e nos vencimentos, e o que acontece se o militar for absolvido ou o processo arquivado. Entender esses aspectos é fundamental para o militar e seus familiares, bem como para os profissionais do direito que atuam nessa área.
Quais são as Consequências Jurídicas e Administrativas para o Militar Réu
Quando um militar se torna réu em um processo criminal, as consequências podem ser tanto jurídicas, advindas da própria ação penal, quanto administrativas, impostas pela corporação. A natureza do crime (militar ou comum) e a fase do processo influenciam diretamente quais medidas serão tomadas.
No âmbito jurídico, o militar será submetido às regras do Código de Processo Penal Militar (se o crime for militar) ou do Código de Processo Penal (se o crime for comum). Isso inclui o direito à ampla defesa, ao contraditório, à produção de provas e a todos os recursos cabíveis. Paralelamente, a instituição militar pode instaurar procedimentos administrativos disciplinares para apurar a conduta do militar sob o prisma disciplinar, independentemente do andamento do processo criminal. A sanção administrativa pode ser aplicada mesmo antes de uma condenação judicial, desde que haja elementos suficientes para caracterizar uma transgressão disciplinar grave.
O Processo Criminal Suspende a Carreira Militar?
A simples instauração de um processo criminal contra um militar, por si só, não suspende automaticamente a carreira militar nem resulta no seu desligamento. O militar continua em sua função, salvo se houver uma medida cautelar ou decisão administrativa que determine o contrário. No entanto, o militar réu fica em uma situação de instabilidade, sujeita a diversas restrições e impactos.
A suspensão da carreira, no sentido de perda temporária da função ou de direitos, pode ocorrer em situações específicas. Por exemplo, se for decretada uma prisão preventiva ou afastamento do cargo, ou se houver suspensão de direitos durante o processo. A lei não prevê uma suspensão genérica da carreira apenas pela existência de um processo, mas as consequências indiretas podem ser significativas.
Afastamento do Cargo e Prisão Preventiva
Em alguns casos, a situação do militar réu pode levar ao afastamento temporário do cargo ou até mesmo à prisão preventiva. O Código de Processo Penal Militar (CPPM) e a legislação processual penal comum preveem essas medidas:
- Afastamento do Cargo: Pode ser determinado pela autoridade militar ou judicial quando a permanência do militar em suas funções for incompatível com a apuração dos fatos, oferecer risco à ordem pública, à instrução criminal ou à disciplina militar. Esse afastamento é uma medida cautelar, não uma punição.
- Prisão Preventiva: É uma medida extrema, decretada pelo juiz quando houver indícios de autoria e materialidade do crime, e a liberdade do militar representar risco para a ordem pública, a ordem econômica, a instrução criminal, a aplicação da lei penal ou para a hierarquia e disciplina militares (no caso de crimes militares). A prisão preventiva do militar pode ocorrer em local sob administração militar, como um quartel ou prisão militar, ou em estabelecimento prisional comum, dependendo da natureza do crime e da disponibilidade de vagas.
Essas medidas cautelares visam a garantir a lisura do processo e a proteção dos interesses da administração militar e da sociedade, não constituindo antecipação de pena.
Reflexos na Promoção e nos Vencimentos
O fato de ser réu em um processo criminal pode ter impactos significativos na carreira do militar, especialmente no que tange às promoções e vencimentos:
- Promoção: Muitos estatutos e regulamentos militares estabelecem que o militar que responde a processo criminal não pode ser promovido até que haja uma decisão final. A subida na carreira fica, portanto, suspensa ou impedida enquanto perdurar a situação de réu, a menos que as normas internas da corporação permitam exceções.
- Vencimentos: Em regra, o simples fato de ser réu não implica na suspensão imediata dos vencimentos. No entanto, se o militar for afastado do cargo sem que haja previsão legal para a continuidade integral dos vencimentos, ou se for preso preventivamente, pode haver retenção ou redução de parte do salário, especialmente daquelas parcelas relacionadas ao efetivo exercício da função (como adicionais de risco ou de localidade, por exemplo). A perda integral dos vencimentos geralmente só ocorre após uma condenação transitada em julgado que resulte em demissão ou exclusão.
É importante consultar o estatuto da corporação específica para entender as regras detalhadas sobre promoções e vencimentos nessas situações.
O que Acontece se Houver Absolvição ou Arquivamento
Se o militar for absolvido no processo criminal ou se o processo for arquivado, a situação tende a ser revertida, mas nem sempre de forma automática e integral:
- Absolvição ou Arquivamento: Uma absolvição, por inexistência do fato, negativa de autoria, ou qualquer outra razão que afaste a responsabilidade criminal, ou o arquivamento do inquérito ou processo, geralmente implica no retorno do militar às suas condições anteriores.
- Restabelecimento de Direitos: O militar deve ter seus direitos restabelecidos, incluindo a possibilidade de ser promovido se preencher os demais requisitos e, se houve retenção de vencimentos, o direito à sua restituição. No entanto, é comum que o militar precise solicitar formalmente o restabelecimento de seus direitos e, em alguns casos, pode ser necessário um mandado de segurança ou outra ação judicial para garantir que todos os efeitos negativos sejam desfeitos.
- Impactos Administrativos: Mesmo com a absolvição criminal, a corporação militar pode ter instaurado um processo administrativo disciplinar. A absolvição criminal, dependendo do fundamento, pode ou não vincular a decisão administrativa. Se a absolvição se deu por inexistência do fato ou negativa de autoria, ela impede a punição administrativa. Se foi por falta de provas suficientes para a condenação criminal, mas restaram elementos que configuram transgressão disciplinar, a punição administrativa ainda pode ser aplicada.
Por isso, mesmo após uma decisão favorável na esfera criminal, o acompanhamento jurídico é vital para assegurar o pleno restabelecimento da situação do militar.
Lidar com um processo criminal sendo militar é uma situação delicada e com muitas variáveis. A assistência de um advogado especializado em Direito Militar é indispensável para proteger seus direitos e sua carreira em todas as etapas.
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Referências:
Sócio e Advogado – OAB/PE 41.203
Advogado criminalista, militar e em processo administrativo disciplinar, especializado em Direito Penal Militar e Disciplinar Militar, com mais de uma década de atuação.
Graduado em Direito pela FDR-UFPE (2015), pós-graduado em Direito Civil e Processual Civil (ESA-OAB/PE) e em Tribunal do Júri e Execução Penal. Professor de Direito Penal Militar no CFOA (2017) e autor do artigo "Crise na Separação dos Três Poderes", publicado na Revista Acadêmica da FDR (2015).
Atuou em mais de 956 processos, sendo 293 processos administrativos disciplinares, com 95% de absolvições. Especialista em sessões do Tribunal do Júri, com mais de 10 sustentações orais e 100% de aproveitamento.
Atualmente, também é autor de artigos jurídicos no Blog da Reis Advocacia, onde compartilha conteúdos jurídicos atualizados na área de Direito Criminal, Militar e Processo Administrativo Disciplinar, com foco em auxiliar militares e servidores públicos na defesa de seus direitos.





