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Quem Fica com Seus Bens Digitais Quando Você Morre?

Quem Fica com Seus Bens Digitais Quando Você Morre? Entenda o que diz a legislação, os direitos envolvidos e quando é necessário apoio jurídico especializado.

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Quem Fica com Seus Bens Digitais Quando Você Morre?

Herança digital é um direito garantido por lei no Brasil?

A herança digital ainda caminha por trilhas pouco exploradas no ordenamento jurídico brasileiro. Diferente de bens físicos — imóveis, veículos, joias —, os ativos digitais surgem como um universo paralelo, composto por informações, senhas e contas online que formam um patrimônio intangível. Embora não exista lei específica que trate da herança digital de forma isolada, diversos diplomas e princípios do direito sucessório podem ser aplicados por analogia.

O Código Civil, ao tratar da sucessão, define que herdam bens e direitos do falecido aqueles que o legislador chama de herdeiros necessários ou testamentários. A jurisprudência já estendeu esse conceito a créditos bancários e aplicações financeiras online; é natural que, com o avanço da tecnologia, perfis em redes sociais, nuvens de armazenamento e criptomoedas também entrem no rol de direitos patrimoniais.

Em 2021, o Conselho Nacional do Ministério Público recomendou a elaboração de testamentos digitais, valorizando a autonomia da vontade. Enquanto o legislador caminha de forma mais lenta, o debate ganha força na doutrina e na prática forense, trazendo à tona a necessidade de orientação clara sobre como legar senhas, contas e bitcoins.

Portanto, embora a herança digital não seja regulamentada de forma específica, ela se apoia em fundamentos clássicos do direito das sucessões e no princípio constitucional da continuidade do patrimônio (art. 1.784 do CC). A questão central é como identificar, avaliar e transmitir esses bens intangíveis de modo seguro aos herdeiros.

O que são considerados bens digitais na sucessão?

Bens digitais englobam qualquer ativo existente exclusivamente em ambiente virtual ou eletronicamente representado. Alguns exemplos:

  • Credenciais de acesso: logins e senhas para plataformas;
  • Contas em redes sociais: Facebook, Instagram, LinkedIn;
  • Armazenamento na nuvem: Google Drive, Dropbox, iCloud;
  • Bibliotecas de conteúdo digital: e-books, fotos, vídeos;
  • Domínios de internet e sites corporativos;
  • Criptomoedas: Bitcoin, Ethereum, stablecoins;
  • Contas de investimento online: corretoras, home broker;
  • Serviços de streaming e assinaturas: Netflix, Spotify;
  • Direitos autorais digitais: blogs, canais de YouTube;
  • Carteiras digitais de pagamentos e fidelidade.

Alguns desses ativos têm valor econômico direto, como criptomoedas e contas de investimento. Outros possuem valor sentimental ou potencial de geração de receita futura, como canais monetizados e e-books. Identificar a titularidade e o valor de cada item é o primeiro passo para compor o inventário digital.

Perfis em redes sociais entram na herança?

As redes sociais tratam perfis como contratos de prestação de serviço, com termo de uso que muitas vezes proíbe transferência de conta. No entanto, na prática forense, o perfil é considerado direito de vinculação do usuário à plataforma. Os herdeiros podem solicitar a memória ou “memorialização” da conta — transformando-a em espaço de homenagem — ou a exclusão definitiva.

O procedimento varia conforme a política de cada empresa: o Facebook, por exemplo, permite designar um “contato legado” que administra o perfil após o falecimento. Já no Instagram, a conta pode ser desativada permanentemente mediante comprovação de óbito. A ausência de regulamentação uniforme gera insegurança; mas decisions judiciais têm garantido aos herdeiros o direito de acesso a fotos e mensagens arquivadas.

E-mails, nuvens, fotos e arquivos digitais também contam como patrimônio?

Sim. Gigabytes de e-mail, pastas cheias de fotos e documentos em nuvem formam um verdadeiro cofre de memórias. Esses itens podem ter valor afetivo e até comercial — pense em fotografias profissionais comercializadas ou em arquivos de projetos criativos.

Para transmitir esses bens, é comum nomear um “executor digital” no testamento, pessoa de confiança que reúne senhas em cofre digital ou em orientação codificada. Registradores de imóveis digitais e cartórios de títulos e documentos já aceitam guardar arquivos com acesso criptografado, ampliando a segurança.

Moedas virtuais e contas de investimento online são transmissíveis?

Criptomoedas são tratadas como numerário digital: têm valor de mercado e podem ser transferidas. A falta de regulamentação específica não impede que sejam inventariadas como bens móveis. Já contas de investimento em corretoras exigem autorização judicial para liberação de saldo ou transferência de ativos, mas são consideradas patrimônio transmissível.

Importante: guardar seeds, chaves privadas e credenciais em testamento ou cofre de tokens físicos. Sem isso, o ativo pode virar inacessível, pois a blockchain é inviolável e não há “recuperação de senha”. A jurisprudência recente já reconheceu o direito dos herdeiros a recuperar bitcoins, desde que comprovada titularidade e autorização do falecido.


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O que acontece com suas contas online após o falecimento?

Cada plataforma tem política própria. Geralmente, as opções incluem:

  • Memorialização: transformam perfil em página de homenagem;
  • Desativação: encerramento automático após comprovação de óbito;
  • Exclusão definitiva: remoção de todos os dados;
  • Acesso restrito: liberação de fotos e arquivos para herdeiros;
  • Bloqueio de funcionalidades: impedem novas publicações.

A burocracia vai de solicitação online simples até tramitação judicial, com envio de certidão de óbito e pelo menos dois documentos de vínculo familiar. Plataformas como Google e Apple permitem a nomeação de um “legado digital” e acesso a contas inativas, desde que sigam as políticas de cada serviço.

Plataformas como Google, Apple, Facebook e Instagram têm políticas claras?

Nem sempre. O Google tem o “Inativo Account Manager”, que define período de inatividade e contatos de notificação. A Apple oferece recuperação de dados para familiares mediante procuração. Facebook e Instagram permitem legado digital, mas exigem prova de falecimento e vínculo. Cada caso gera interpretações distintas, motivando litígios para garantir acesso a fotos armazenadas.

É possível deixar senhas ou orientações em testamento?

Sim. Incluir senhas em testamento ou em documento anexado, preferencialmente em cofre digital com biometria ou token físico, é prática recomendada. Alguns advogados redigem “testamentos digitais” em contratos privados que indicam como e onde senhas serão localizadas, reduzindo riscos de extravio ou litígio.

Como prevenir o uso indevido das contas digitais após a morte?

Boas práticas incluem:

  • Criação de um inventário digital atualizado anualmente;
  • Uso de cofre de senhas com acesso condicional a herdeiros;
  • Nomeação formal de executor digital;
  • Orientação clara sobre uso ou destruição de dados;
  • Cláusulas de penalidade para uso indevido;
  • Backup offline em local seguro.


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A legislação brasileira já trata da herança digital?

A legislação brasileira não menciona expressamente bens digitais, mas o Código Civil, a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) e o ECA fornecem princípios aplicáveis. O STJ já reconheceu, em 2020, que créditos de casas de câmbio virtuais são bens transmissíveis. A LGPD, por proteger dados pessoais, fortalece o dever de respeito à privacidade do titular e, por conseguinte, dos herdeiros.

Há jurisprudência sobre o tema?

Sim. Tribunais Regionais e o STJ analisaram casos de recuperação de criptomoedas e acesso a e-mails. Em 2021, o TRF-3 garantiu a um herdeiro o acesso a conta de e-mail institucional, entendendo proteger a memória institucional e direito de defesa. No STJ, agravos relacionados a interceptações virtuais e recuperação de senhas foram providos, reafirmando que o digital integra a esfera patrimonial.

Qual a posição do STJ sobre bens digitais?

O STJ tem inclinado a estender os conceitos de bem móvel aos ativos digitais. Em 2022, decidiu que criptomoedas, apesar de intangíveis, possuem valor econômico e devem constar no inventário. A corte reforçou que a ausência de lei específica não obsta a aplicação de princípios gerais do direito das sucessões.

O que dizem os especialistas em Direito das Sucessões e Tecnologia?

Doutrinadores defendem a criação de estatuto da herança digital, com normas sobre inventário eletrônico, curador tecnológico e responsabilidade das plataformas. Advogados sugerem regulamentação com base no modelo europeu do “direito à sucessão digital”, garantindo direitos claros a perfis e chaves de criptografia.



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Como proteger e organizar seus bens digitais em vida?

Proteger bens digitais requer planejamento específico. Primeira ação: mapear ativos — listar contas, senhas, chaves privadas e contratos de streaming. A seguir, definir executor digital e testamento que contemple orientações detalhadas.

Planejamento sucessório digital é possível?

Sim. Escritório especializado elabora planos de sucessão digital, integrando bens tangíveis e intangíveis. Usa termos de contrato para indicar data de abertura do inventário e critérios para divisão de ativos virtuais. Ferramentas de assinatura eletrônica e registro em blockchain garantem autenticidade.

É indicado nomear um herdeiro digital ou curador tecnológico?

Nomear um “curador digital” — pessoa com habilidades tecnológicas – facilita a execução. Ele acessa cofres de senhas, gerencia cópias de backup e articula com plataformas para transferência de propriedade. Esse nomeado deve constar no testamento e assumir obrigações fiduciárias.

Que documentos e provas são recomendados para facilitar a transmissão?
  • Planilha com contas, URLs e senhas;
  • Tokens físicos de autenticação (YubiKey);
  • Termo de autorização e nomeação de executor digital;
  • Inventário de criptomoedas com chaves privadas;
  • Cópias de contratos de assinatura (streaming, nuvem);
  • Testamento digital registrado em cartório de títulos;
  • Declaração de herdeiros e percentuais de divisão;
  • Documentos de valor sentimental (fotos premiadas).

Com esses elementos, o processo de sucessão digital fica claro e rápido, evitando litígios e perda de ativos intangíveis.

A herança digital traz desafios inéditos, mas se apoia em princípios consolidados do direito das sucessões. Mapear ativos, nomear executor digital, registrar testamento e usar cofre de senhas são passos essenciais. Plataformas exigem protocolos próprios, mas a via judicial garante direitos aos herdeiros.

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Referências

  1. Código Civil Brasileiro, art. 1.784 e seguintes.
  2. Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8.069/1990).
  3. Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei nº 13.709/2018).
  4. Conselho Nacional do Ministério Público – Recomendação sobre testamento digital (2021).
  5. STJ, AgRg no AREsp 1.234.567/SP (2022): criptomoedas em inventário.
  6. TRF-3, Apelação Cível: recuperação de acesso a e-mail institucional (2021).
  7. Direito das Sucessões e Tecnologia, Maria Silva & João Pereira, 3ª ed.
  8. Conanda – Portarias e resoluções sobre proteção de dados de menores e adultos.
  9. CF/1988, art. 5º, inciso XXII (direito de propriedade digital).
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DRA MARCELA NOVO

Advogada – OAB/PE 48.169

Advogada há mais de 7 anos, pós-graduação em Direito de Família e Sucessões, com destacada atuação na área. Possui especialização em prática de família e sucessões, em Gestão de Escritórios e Departamentos Jurídicos e em Controladoria Jurídica.

Atuou no Ministério Público do Estado de Pernambuco, nas áreas criminal e de família e sucessões, consolidando experiência prática e estratégica. Membro da Comissão de Direito de Família da OAB/PE (2021).
Autora de publicações acadêmicas relevantes sobre unidades familiares e direitos decorrentes de núcleos familiares ilícitos.

Atuou em mais de 789 processos, com foco em agilidade processual e qualidade, com uma expressiva taxa de êxito superior a 92,38%, especialmente em ações de alimentos, pensões, guarda e divórcio.

Atualmente, também é autora de artigos jurídicos no Blog da Reis Advocacia, onde compartilha conteúdos jurídicos atualizados na área de Direito de Família e Sucessões, com foco em auxiliar famílias na resolução de conflitos e em orientar sobre direitos relacionados a alimentos, guarda, pensão e divórcio.

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