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Militar Pode Trabalhar Fora do Quartel? O Que Diz a Lei?

Militares podem exercer outra atividade? Descubra o que diz a lei sobre trabalhar fora do quartel e os riscos disciplinares dessa prática.

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Militar pode exercer outra atividade remunerada fora do quartel? Entenda a legislação

A carreira militar, seja nas Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica) ou nas Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares, exige dedicação exclusiva e um compromisso integral com o serviço. A natureza peculiar da vida castrense, pautada pela hierarquia e disciplina, estabelece regras claras sobre a conduta dos militares, inclusive no que tange à possibilidade de exercer outras atividades remuneradas fora do quartel. Essa questão gera muitas dúvidas e é fundamental entender o que a legislação permite e proíbe para evitar sanções disciplinares e penais.

A proibição geral de acumulação de cargos públicos para a maioria dos servidores também se aplica aos militares, com algumas exceções específicas. A lógica por trás dessa restrição é garantir que o militar tenha foco total em suas atribuições, sem que atividades paralelas comprometam sua disponibilidade, desempenho ou a imagem da instituição. No entanto, a legislação evoluiu, e hoje há cenários em que o militar pode sim ter um segundo trabalho, desde que cumprindo certas condições e obtendo as devidas autorizações.

Neste artigo, vamos explorar em detalhes a legislação que rege a acumulação de cargos e atividades para militares. Abordaremos as situações em que o militar pode ter outro trabalho, a importância da autorização da corporação e da compatibilidade de horários, o que é vedado em relação a trabalho informal ou CLT, e as graves consequências disciplinares e penais de uma atividade não autorizada. Entender esses pontos é essencial para a segurança jurídica e a carreira do profissional militar.

O que a legislação militar permite e proíbe sobre atividades externas

A Constituição Federal e os Estatutos dos Militares (Lei nº 6.880/80 para as Forças Armadas, e legislações estaduais para PMs e Bombeiros Militares) estabelecem a regra geral de vedação de acumulação de cargos ou empregos públicos. Para os militares das Forças Armadas, a regra é ainda mais rígida: em geral, não podem acumular cargos públicos civis. Contudo, há exceções pontuais.

A lógica é que o serviço militar exige disponibilidade permanente. O militar é um servidor público com regime jurídico diferenciado, sujeito a regras específicas que visam à manutenção da ordem, da hierarquia e da disciplina. Qualquer atividade externa que possa comprometer esses pilares é, em princípio, proibida.

Situações em que o militar pode ter outro trabalho

Com as alterações promovidas pela Emenda Constitucional nº 101/2019, houve uma flexibilização para os militares estaduais (Polícia Militar e Corpo de Bombeiros Militar) no que tange à acumulação de cargos. Para os militares federais, as regras são mais restritas. Veja as possibilidades:

  • Para Militares Federais (Forças Armadas): Apenas é permitida a acumulação com outro cargo ou emprego privativo de profissionais da saúde, desde que as profissões sejam regulamentadas. Um médico militar, por exemplo, pode atuar também em um hospital civil.
  • Para Militares Estaduais (PM e Bombeiros Militares): Podem acumular o cargo militar com:
    • Um cargo de professor;
    • Um cargo técnico ou científico; ou
    • Um cargo de profissional de saúde.

Em todos esses casos, a acumulação só é permitida se houver compatibilidade de horários e se for respeitado o teto remuneratório do serviço público.

Autorização da corporação e compatibilidade de horários

Mesmo nas situações em que a acumulação é legalmente permitida, é fundamental que o militar obtenha a autorização prévia da sua corporação. Geralmente, essa autorização é precedida de uma análise para verificar a compatibilidade de horários entre as duas atividades e se o novo trabalho não prejudicará o desempenho das funções militares ou a imagem da instituição.

A compatibilidade de horários não se refere apenas à sobreposição direta de expedientes, mas também à garantia de que o militar terá tempo adequado para descanso e recuperação, essenciais para a sua prontidão e saúde no cumprimento das missões militares. A atividade militar sempre deve ser a prioritária e prevalecer sobre qualquer outra.

Trabalho informal ou CLT: o que é vedado

As vedações não se restringem apenas a outros cargos públicos. O militar, em regra, também é proibido de exercer atividades remuneradas na iniciativa privada que não se enquadrem nas exceções constitucionais, especialmente se estas configurarem um vínculo empregatício formal (CLT) ou se demandarem uma dedicação que comprometa suas funções militares.

Trabalhos informais, como bicos ou atividades autônomas pontuais, embora não gerem vínculo CLT, também podem ser vedados se forem habituais, se expuserem o militar a riscos, se entrarem em conflito de interesses com a instituição militar, ou se comprometerem sua disponibilidade ou decoro. A discrição é um valor militar, e atividades que a violem podem gerar problemas.

Existem situações específicas de atividades que são expressamente proibidas a militares, como gerenciar ou administrar sociedade comercial ou industrial, exercer o comércio (exceto como acionista, quotista ou comanditário), ou participar de gerência ou administração de empresa privada.

Consequências disciplinares e penais da atividade não autorizada

O descumprimento das regras sobre acumulação de cargos ou o exercício de atividades remuneradas não autorizadas pode acarretar sérias consequências para o militar. As sanções podem ser de natureza disciplinar e, em alguns casos, até penal:

  • Consequências Disciplinares: O militar pode responder a um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) na corporação. As punições variam conforme a gravidade da infração e o regulamento disciplinar de cada força, podendo ir desde uma advertência, repreensão, detenção ou prisão disciplinar, até a exclusão a bem da disciplina (para praças) ou a perda do posto e da patente (para oficiais), nas situações mais graves de comprovada má-fé ou prejuízo à imagem da instituição.
  • Consequências Penais: Dependendo da natureza da atividade exercida e se houver fraude, desvio de conduta ou outros crimes envolvidos, o militar pode responder a um processo criminal na Justiça Militar ou na Justiça Comum. Isso pode ocorrer, por exemplo, se a atividade envolver o uso indevido da função militar para benefício próprio ou de terceiros, ou se houver prejuízo direto à administração pública.
  • Implicações na Carreira: Mesmo que as punições diretas não sejam as mais severas, o registro de uma infração por atividade não autorizada pode impactar negativamente a carreira do militar, dificultando promoções, cursos e transferências desejadas.

Diante da complexidade da legislação e das possíveis sanções, é crucial que o militar que cogita exercer uma atividade remunerada fora do quartel busque orientação jurídica especializada. Um advogado com experiência em Direito Militar poderá analisar o caso específico, verificar a compatibilidade legal e orientar sobre os procedimentos necessários para evitar problemas. A transparência e a obtenção das devidas autorizações são o melhor caminho para proteger a carreira e o patrimônio do militar.

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Referências:

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DR JORGE GUIMARAES NOVO

Sócio e Advogado – OAB/PE 41.203

Advogado criminalista, militar e em processo administrativo disciplinar, especializado em Direito Penal Militar e Disciplinar Militar, com mais de uma década de atuação.

Graduado em Direito pela FDR-UFPE (2015), pós-graduado em Direito Civil e Processual Civil (ESA-OAB/PE) e em Tribunal do Júri e Execução Penal. Professor de Direito Penal Militar no CFOA (2017) e autor do artigo "Crise na Separação dos Três Poderes", publicado na Revista Acadêmica da FDR (2015).

Atuou em mais de 956 processos, sendo 293 processos administrativos disciplinares, com 95% de absolvições. Especialista em sessões do Tribunal do Júri, com mais de 10 sustentações orais e 100% de aproveitamento.

Atualmente, também é autor de artigos jurídicos no Blog da Reis Advocacia, onde compartilha conteúdos jurídicos atualizados na área de Direito Criminal, Militar e Processo Administrativo Disciplinar, com foco em auxiliar militares e servidores públicos na defesa de seus direitos.

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