Demissão por usar tranças: Justiça reconhece racismo
“Ela me disse que se eu tivesse um estilo mais social, ainda aceitaria meu cabelo. Mas eu não tenho um estilo social”. Foi com essas palavras que Gabriela Barros, uma jovem negra de Maceió (AL), soube que seria dispensada do trabalho por uma razão cruel: usar tranças. A demissão ocorreu em março de 2025, diante de colegas, e se tornou um marco na luta contra o racismo estrutural no ambiente profissional.
A 9ª Vara do Trabalho de Maceió reconheceu a prática discriminatória e condenou a empresa ao pagamento de R$ 15 mil por danos morais. O caso, que ganhou repercussão nacional após o desabafo de Gabriela nas redes sociais, simboliza a urgência do combate às formas veladas de racismo ainda presentes em muitas relações de trabalho.
A “demissão por usar tranças” não é um fato isolado. Representa uma dor coletiva de muitas mulheres negras, que enfrentam olhares tortos, advertências e sanções por usarem elementos de sua identidade cultural.
Neste artigo, você vai entender profundamente o caso, conhecer as teses jurídicas aplicadas, as repercussões legais e como buscar ajuda caso passe por uma situação semelhante.
Demissão por usar tranças: análise do caso de discriminação racial no trabalho
Gabriela Barros era funcionária de uma empresa de consórcio em Maceió desde outubro de 2024. Jovem, negra e determinada, sempre usou suas tranças como expressão de identidade e ancestralidade. Em março de 2025, ao decidir manter seu penteado, foi surpreendida com uma demissão pública, às 8h58 da manhã, na frente de colegas de trabalho.
Segundo o processo judicial, Gabriela já havia sido advertida anteriormente para retirar as tranças, sob pena de ser demitida. Na primeira vez, cedeu à pressão. Na segunda, decidiu resistir. “Eu não vou tirar a trança dessa vez. Isso vai totalmente contra o que eu acredito, contra o que eu prego e contra as minhas vivências”, declarou em vídeo publicado nas redes sociais.
A juíza Emanuel Holanda Almeida, da 9ª Vara do Trabalho de Maceió, concluiu que a demissão foi um ato de racismo estrutural, ainda que disfarçado sob argumentos estéticos. Em sua decisão, afirmou:
“A reclamada não apresentou qualquer justificativa razoável, proporcional e objetiva para vedar o uso de tranças afro pela reclamante. Não se tratava de questão de higiene, segurança ou qualquer outro motivo legítimo relacionado à atividade de vendedora”.
Além disso, o magistrado ressaltou:
“Quando um trabalhador é impedido de usar penteados afro-culturais, como as tranças, ou é tratado de maneira distinta por causa disso, estamos diante de discriminação, exceto se existir um motivo claro e razoável para a restrição”.
A decisão judicial destacou que a imposição de padrões estéticos eurocentrados constitui uma forma indireta, mas devastadora, de exclusão racial. Foi reconhecido que a “demissão por usar tranças” é reflexo de uma mentalidade discriminatória que precisa ser combatida com rigor legal.
O contexto jurídico da proibição de penteados afro no ambiente profissional
A “demissão por usar tranças” levanta questões jurídicas cruciais sobre igualdade, diversidade e respeito à identidade étnico-racial no ambiente de trabalho. Diversas teses jurídicas são aplicáveis a esse tipo de caso, e merecem ser destacadas:
- Princípio da Dignidade da Pessoa Humana (art. 1º, III, da CF/88)
- Princípio da Igualdade (art. 5º, caput e inciso XLI, da CF/88)
- Art. 1º da Lei 9.029/95: proibição de práticas discriminatórias nas relações de trabalho
- Convenção nº 111 da OIT, que trata da discriminação em matéria de emprego e ocupação
- Art. 373-A, VI, da CLT: vedação à exigência de padrões estéticos discriminatórios
- Jurisprudência consolidada do TST e TRTs reconhecendo racismo institucional e estrutural
No caso de Gabriela, a tese de racismo estrutural foi central. Segundo o juiz, ao exigir que a vendedora alterasse seu cabelo para se adequar a um suposto “padrão social”, a empresa violou o direito fundamental à identidade racial.
A defesa da empresa alegou se tratar de política interna relacionada à imagem da empresa. Porém, não conseguiu demonstrar qualquer necessidade técnica ou legal para a proibição de tranças.
Opiniões divididas marcaram o caso: defensores da empresa argumentaram que se tratava de uma diretriz de apresentação. Já entidades do movimento negro e especialistas em Direito do Trabalho ressaltaram que padrões estéticos não podem se sobrepor a direitos fundamentais.
Repercussões legais e soluções jurídicas para vítimas de discriminação por cabelo
A decisão no caso de Gabriela gerou intensa repercussão na sociedade e no meio jurídico. Para vítimas de situações semelhantes à “demissão por usar tranças”, algumas soluções jurídicas podem ser adotadas:
- Reunir provas: prints de mensagens, vídeos, testemunhas
- Denunciar ao Ministério Público do Trabalho (MPT)
- Procurar um advogado trabalhista especializado em discriminação
- Propor ação judicial pleiteando:
- Indenização por danos morais
- Declaração de nulidade da dispensa
- Multa por discriminação com base na Lei 9.029/95
- Denunciar em canais de ouvidoria da empresa e redes sociais (com cautela)
- Buscar apoio em coletivos e entidades de combate ao racismo
Casos como o de Gabriela deixam claro que o sistema jurídico brasileiro está cada vez mais sensível à discriminação racial no trabalho. O reconhecimento da “demissão por usar tranças” como ato discriminatório fortalece a jurisprudência e dá esperança a milhares de mulheres negras.
O escritório Reis Advocacia possui sólida experiência na defesa de trabalhadores vítimas de discriminação racial, e está pronto para oferecer acolhimento jurídico e humano a quem vive essa dura realidade.
Advogado Direito Trabalhista
O caso de Gabriela Barros não foi apenas uma “demissão por usar tranças”. Foi a reafirmação de um sistema que insiste em negar a diversidade e a individualidade de corpos negros. A sentença da 9ª Vara do Trabalho de Maceió mostra que o Judiciário está disposto a dar voz às vítimas do racismo institucional.
Como advogado atuante na área trabalhista, posso afirmar que decisões como essa representam um marco na luta contra o racismo no mercado de trabalho. Ainda cabe recurso, mas o entendimento firmado é claro: normas estéticas que excluem características afrodescendentes são ilegais e inconstitucionais.
Esse processo ensina que conhecer seus direitos é o primeiro passo para resistir. E que cada vitória judicial é também uma vitória humana.
Em casos como esse, é preciso atuar com compromisso ético, técnico e emocional em causas de discriminação racial no trabalho. Cada cliente é acolhido com escuta ativa, estratégia e defesa firme.
Perguntas Frequentes sobre Demissão por Usar Tranças
- Posso ser demitido(a) por usar tranças no trabalho?
Não. A exigência de mudança de penteado afro, como tranças, sem justificativa técnica ou legal, configura discriminação racial. - Quais são meus direitos se fui demitido por causa do meu cabelo?
Você pode buscar reparação por danos morais e, em alguns casos, pedir a reintegração ao emprego. - Como provar que a demissão foi por racismo?
Mensagens, testemunhas, advertências e relatos públicos ajudam a demonstrar a motivação discriminatória. - O que diz a lei sobre esse tipo de discriminação?
A Lei 9.029/95 e a Constituição proíbem práticas discriminatórias em razão de raça no ambiente de trabalho. - É preciso contratar advogado para entrar com ação?
Sim, é recomendável contar com um advogado especializado para conduzir o processo com segurança. - A empresa pode alegar padrão estético como justificativa?
Apenas se houver justificativa técnica, proporcional e razoável. Do contrário, trata-se de discriminação. - Quanto posso receber de indenização?
O valor varia conforme o caso, mas já existem decisões de até R$ 50 mil por danos morais. - O que fazer se estou sofrendo esse tipo de pressão?
Reúna provas, procure orientação jurídica e denuncie ao MPT ou Defensoria Pública. - Esse tipo de caso é comum?
Infelizmente, sim. O racismo institucional ainda é presente no mercado de trabalho.
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Referências:
- CNN – Justiça condena empregadora por demitir vendedora que usava tranças em AL
- SBT News – Jovem ganha indenização por discriminação racial após ser demitida por usar tranças
Sócio e Advogado – OAB/PE 41.203
Advogado criminalista, militar e em processo administrativo disciplinar, especializado em Direito Penal Militar e Disciplinar Militar, com mais de uma década de atuação.
Graduado em Direito pela FDR-UFPE (2015), pós-graduado em Direito Civil e Processual Civil (ESA-OAB/PE) e em Tribunal do Júri e Execução Penal. Professor de Direito Penal Militar no CFOA (2017) e autor do artigo "Crise na Separação dos Três Poderes", publicado na Revista Acadêmica da FDR (2015).
Atuou em mais de 956 processos, sendo 293 processos administrativos disciplinares, com 95% de absolvições. Especialista em sessões do Tribunal do Júri, com mais de 10 sustentações orais e 100% de aproveitamento.
Atualmente, também é autor de artigos jurídicos no Blog da Reis Advocacia, onde compartilha conteúdos jurídicos atualizados na área de Direito Criminal, Militar e Processo Administrativo Disciplinar, com foco em auxiliar militares e servidores públicos na defesa de seus direitos.




