Indenização por Licença Especial Não Gozada: Jurisprudência e Prazos de Prescrição
Ao longo de uma carreira dedicada ao serviço público, muitos servidores – civis e militares – enfrentam rotinas intensas, missões urgentes e cargas de trabalho que impedem a fruição de períodos de descanso legalmente previstos. A licença especial, prevista em lei ou regulamento interno, assegura 90 dias de afastamento remunerado a cada cinco anos de efetivo exercício, sem faltas injustificadas. Mas o que ocorre quando esse direito não é usufruído? A conversão pecuniária desse período não gozado é um direito consolidado nos tribunais superiores, mas exige atenção aos prazos de prescrição e ao correto cálculo monetário.
Neste guia aprofundado, vamos explorar:
- Origens e fundamentos legais da licença especial;
- Natureza jurídica da conversão em pecúnia;
- Formação da jurisprudência no STF (Tema 635) e no STJ (Tema 1086);
- Prazos de prescrição e contagem do termo inicial;
- Procedimentos administrativos e judiciais;
- Principais desafios práticos e estratégias de sucesso;
- Links para artigos complementares e referências essenciais.
1. Origens e Fundamentos da Licença Especial
A licença especial, às vezes chamada de licença-prêmio em alguns estatutos, surgiu como forma de reconhecer o empenho do servidor que permanece sem faltas injustificadas por cinco anos consecutivos. A cada quinquênio, o servidor faz jus a até 90 dias de afastamento integralmente remunerado. Quando não fruída – por necessidade do serviço, convocação urgente ou encerramento de carreira – a legislação e regulamentos internos autorizam a conversão em dinheiro.
1.1 Histórico Legislativo
As primeiras disposições sobre afastamentos recompensatórios para servidores públicos remontam ao Decreto 20.910/1932. Essa norma previu, de forma pioneira, regras para fruição e conversão. Com o tempo, carreiras específicas ganharam dispositivos próprios:
- Lei 8.112/1990 (art. 102-A) para servidores federais civis;
- Lei 6.880/1980 (art. 68) para militares da União;
- Estatutos estaduais e municipais e regulamentos internos de tribunais e Ministério Público.
1.2 Princípios Constitucionais
O fundamento constitucional está no artigo 37, § 5º, que protege o direito adquirido e impede o enriquecimento sem causa da Administração Pública. Três princípios se destacam:
- Legalidade: apenas a lei pode instituir, alterar ou extinguir direitos do servidor;
- Vedação ao enriquecimento sem causa: reparar o servidor que não pôde gozar o direito sem onerar o erário indevidamente;
- Eficiência e valorização: estimular a dedicação prolongada ao serviço público.
2. A Natureza Jurídica da Conversão em Pecúnia
O debate sobre natureza salarial ou indenizatória durou décadas. O entendimento hoje pacificado nos tribunais superiores é de que a conversão da licença especial não gozada tem caráter indenizatório. Ou seja, não se incorpora aos vencimentos como vantagem permanente, mas ressarce o servidor pelo período de descanso não usufruído.
2.1 Reflexos Práticos
- Não integra a remuneração permanente nem serve de base para outros proventos;
- É corrigida monetariamente (IPCA-E) até a data do efetivo pagamento;
- Recebe juros de mora de 1% ao mês, calculados de forma simples;
- Protege a confiança legítima do servidor – ato jurídico perfeito.
2.2 Exemplo de Cálculo
Suponha servidor com 20 anos de exercício, sem fruir 360 dias de licença. Se aposentado com remuneração de R$ 10.000,00, o cálculo inicial seria:
- 360 dias ÷ 30 = 12 meses;
- 12 × R$ 10.000,00 = R$ 120.000,00 (base de cálculo);
- Correção IPCA-E e juros de 1% ao mês incidem sobre esse montante até a data do pagamento.
3. Formação da Jurisprudência nos Tribunais Superiores
A consolidação do direito à conversão pecuniária ocorreu em duas grandes etapas jurisprudenciais, refletidas em Temas de repercussão geral.
3.1 STF – Tema 635
Em 2016, o STF uniformizou que a ausência de requerimento ou de fruição não afasta o direito adquirido. O Tema 635 fixou: “é assegurada ao servidor ativo ou inativo a conversão de licenças não gozadas em pecúnia, vedado o enriquecimento sem causa da Administração”.
3.2 STJ – Tema 1086
Em 2018, o STJ tratou do cálculo, definindo o uso da última remuneração integral e a aplicação de correção monetária (IPCA-E) e juros de 1% ao mês desde o termo a quo. Essa uniformização pacificou divergências regionais e orientou a execução de precatórios e RPVs.
4. Prescrição: Como e Quando Ajuizar
O prazo prescricional quinquenal é regra para ações contra a Administração Pública. Quem perde o prazo perde o direito, pois a prescrição torna o crédito inexigível.
4.1 Termo Inicial da Prescrição
- Inativos e exonerados: data da aposentadoria ou exoneração;
- Ativos: data do término do quinquênio não fruído.
4.2 Suspensão e Interrupção
Um requerimento administrativo protocolado dentro do prazo pode suspender a prescrição até decisão definitiva, se reconhecida pela jurisprudência local. A interrupção ocorre com citação em ação judicial.
4.3 Exemplo Prático de Contagem
Licença não fruída em 20/03/2017 → prazo até 20/03/2022. Pedido administrativo em 01/02/2022, resposta negativa em 06/2023 → suspensão parcial, reativando prazo até 01/02/2027.
5. Procedimentos Práticos
5.1 Via Administrativa
- Elabore requerimento claro, listando cada quinquênio;
- Anexe certidões, portarias e holerites;
- Protocole com confirmação (aviso de recebimento);
- Acompanhe prazos e protocolos internos.
5.2 Via Judicial
- Mandado de Segurança: para direito líquido e certo, com tutela antecipada (CPC art. 1.048);
- Ação Ordinária: quando há discussão de cálculo;
- Impugne defesas de prescrição ou teto remuneratório;
- Requeira precatório ou RPV, conforme montante.
6. Principais Desafios e Estratégias
- Contestação de termo inicial e prescrição pela Administração;
- Divergência sobre índice de correção;
- Limitação pelo teto constitucional;
- Falta de documentação completa.
Planilhas personalizadas, jurisprudência de apoio e pedido de tutela antecipada são cruciais para superar obstáculos e garantir o recebimento célere.
7. Conclusão e Próximos Passos
A conversão pecuniária de licença especial não gozada é direito constitucionalmente protegido e consolidado no STF e STJ, mas exige observância estrita dos prazos e cálculos. Inicie o processo administrativo imediatamente e, se necessário, ajuíze ação antes do quinquênio final. Na Reis Advocacia, auxiliamos em cada etapa, do protocolo ao recebimento.
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Referências
- Constituição Federal de 1988, art. 37, § 5º.
- Decreto nº 20.910/1932.
- Lei nº 8.112/1990, art. 102-A.
- Lei nº 6.880/1980, art. 68.
- STF – Tema 635 (Repercussão Geral).
- STJ – Tema 1086 (Repercussão Geral).
- CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo.
- CPC – art. 1.048 (tutela antecipada).
- STJ – Súmula 90 (retroatividade da remuneração).
Dr. Tiago O. Reis, OAB/PE 34.925, OAB/SP 532.058, OAB/RN 22.557
Advogado especializado em ações que envolvem militares há mais de 12 anos, ex-2º Sargento da Polícia Militar e Diretor do Centro de Apoio aos Policiais e Bombeiros Militares de Pernambuco. Atuou em mais de 3039 processos em defesa da categoria, obtendo absolvições em PADs, processos de licenciamento e conselhos de disciplina.
Criou teses relevantes, como o Ação do Soldo Mínimo, Auxílio-transporte, Promoção Decenal da Guarda e Fluxo Constante de Promoção por Antiguidade.
Foi professor de legislação policial e sindicante em diversos processos administrativos. Pós-graduado em Direito Constitucional e Processual, com MBA em Gestão Empresarial, é referência na luta por melhores condições jurídicas e de trabalho aos militares.
Atualmente, também é autor de artigos e e Editor-Chefe no Blog da Reis Advocacia, onde compartilha conteúdos jurídicos atualizados na área de Direito Criminal, Militar e Processo Administrativo Disciplinar, com foco em auxiliar militares e servidores públicos na defesa de seus direitos.





