Conversão da Licença Especial em Pecúnia: Direito Adquirido e Portaria Normativa de 2018
A licença especial era, para muitos servidores públicos, a conquista de períodos de afastamento remunerado após cada quinquênio de efetivo exercício. Com a Reforma da Previdência (EC 103/2019) vieram alterações profundas no regime de benefícios e aposentadorias, revogando diversas regras que permitiam esse afastamento ou a sua conversão em dinheiro. No entanto, o Supremo Tribunal Federal (STF) firmou entendimento de que os servidores que já haviam adquirido o direito à conversão da licença especial em pecúnia antes da emenda constitucional continuam protegidos pelo direito adquirido, independentemente de qualquer interrupção na via administrativa.
Neste guia completo, você verá:
- O conceito de licença especial e os critérios de concessão;
- As diferenças claríssimas entre licença especial e licença-prêmio;
- Como a EC nº 103/2019 impactou direitos futuros e preservou os adquiridos;
- Jurisprudência do STF e do STJ que assegura a conversão em dinheiro;
- Regras específicas da Portaria Normativa nº 3, de 05/07/2018;
- Passo a passo para requerimento administrativo e, se necessário, judicial;
- Prazos de prescrição e dicas para não perder o direito.
Entenda como funciona a conversão da licença especial em dinheiro mesmo após a reforma da legislação
Antes da emenda constitucional, a licença especial consistia em afastamentos de até 90 dias remunerados a cada cinco anos de serviço para carreiras específicas. Quando o servidor não podia usufruir desse afastamento por necessidade do órgão, tinha a opção de converter os dias não gozados em indenização pecuniária, calculada sobre a remuneração do cargo. Após a EC 103/2019, muitos órgãos suspenderam novos contadores de quinquênios para licença especial. Porém, o STF reconheceu que os períodos já completados até a data da promulgação da emenda geraram direito adquirido, ou seja, não podem ser suprimidos pelo poder público.
A Portaria Normativa nº 3/2018, emitida pelo Ministério do Planejamento (atual Ministério da Economia), regulamentou com detalhes a forma de cálculo e os procedimentos a serem seguidos para essa conversão. Assim, mesmo que a carreira não conte mais novos períodos para licença especial, quem já tinha saldo pode protocolar o pedido e receber a indenização.
O que é a licença especial e quem tinha direito ao benefício
A licença especial era instituída por regulamentos internos de alguns órgãos federais, estaduais ou municipais, destinando-se a determinadas carreiras: magistrados, membros do Ministério Público, servidores que atuavam em atividades de alto nível de estresse, policiais e militares. A cada cinco anos completos de efetivo exercício, o servidor acumulava direito a até 90 dias corridos de afastamento integralmente remunerado.
Para ter direito, o servidor precisava:
- Estar em efetivo exercício, sem interrupções prolongadas;
- Encontrar-se efetivo no cargo em que completou o quinquênio;
- Não ter sido punido disciplinarmente com suspensão superior a 30 dias no período;
- Fazer requerimento dentro dos prazos previstos no regulamento interno.
Diferença entre licença especial e licença-prêmio
Embora ambos os afastamentos sejam concedidos a cada quinquênio, possuem origens e fundamentos legais distintos:
- Licença-prêmio: prevista em leis específicas do ente federativo (artigos de lei estadual, municipal ou federal), era um benefício concedido de forma uniforme a todos os servidores estatutários daquele ente, sem distinção de carreira.
- Licença especial: regulada por normativos internos de órgãos (regulamento, decreto ou portaria), aplicável apenas a carreiras específicas com atividades definidas nos atos que a instituíram.
Na prática, as licenças-prêmio e especiais acabavam por ser equiparadas em muitos tribunais e processos judiciais, mas a distinção legal é relevante para definir o regramento e o cálculo da conversão em pecúnia.
Legislação anterior à EC nº 103/2019 (Reforma da Previdência)
Até 12 de novembro de 2019, data de promulgação da Emenda Constitucional nº 103, os servidores que completassem cada quinquênio podiam:
- Gozo da licença: afastamento remunerado de até 90 dias;
- Conversão em dinheiro: indenização equivalente à remuneração mensal, por cada mês de licença não gozado.
Esse direito estava respaldado em estatutos e regulamentos (Lei 8.112/90, art. 102-A; Lei 6.880/80, art. 68, no caso dos militares; decretos e portarias internas) e consolidado por decisões do Supremo (Tema 227/STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que afirmavam a haver caráter indenizatório e irredutibilidade da base de cálculo.
Situação dos servidores que adquiriram o direito antes da revogação
O conceito de direito adquirido – plasmado no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal – garante que o agente público não pode ser prejudicado por edição de norma superveniente que extinga benefício já incorporado ao patrimônio jurídico decorrente de fato pretérito (quinquênio completado).
Assim, ainda que o órgão tenha suspendido novos contadores de licenças especiais, aqueles que já tivessem completado o quinto, décimo ou décimo quinto ano antes de 12/11/2019 mantêm o direito de converter ou gozar o benefício, sem qualquer prejuízo.
Direito adquirido à conversão em pecúnia após aposentadoria
O STF consolidou a proteção do servidor inativo: mesmo após a aposentadoria, o agente que não fruiu a licença especial pode requerer a conversão em pecúnia, pois trata-se de direito subjetivo individual patrimonial. Essa tutela se estende ao regime próprio da Previdência, sem distinção entre ativos e inativos.
Caso o servidor tenha se aposentado sem gozar integralmente os dias de licença especial, pode ingressar com pedido de conversão administrativa ou ação judicial, pleiteando:
- Reconhecimento do saldo de dias não usufruídos;
- Cálculo atuarial da indenização sobre remuneração da época do desligamento;
- Correção monetária e juros legais desde a data em que o direito se tornou líquido e certo.
Entendimentos do STJ e jurisprudência atualizada
O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do AgInt no REsp 1.825.093/DF, reforçou que a Portaria Normativa nº 3/2018 não pode criar óbices ao direito já adquirido. A corte determinou:
- Base de cálculo sobre a última remuneração integral;
- Aplicação de juros de mora de 1% ao mês e correção monetária oficial;
- Isonomia entre servidores civis e militares para evitar tratamento diferenciado.
Jurisprudência mais recente vem uniformizando esse entendimento, afastando quaisquer teses de desvinculação do benefício da administração pública.
Casos em que o servidor pode requerer o pagamento judicialmente
A via judicial se faz necessária quando:
- Requerimento administrativo é indeferido;
- Prazo de resposta ultrapassa 60 dias (omissão administrativa);
- Órgão reconhece o direito, mas calcula valor irrisório ou em desacordo com a portaria;
- Exigência de documentação que já consta no processo funcional, configurando excesso de exigência.
Nesses cenários, manda-se:
- Mandado de Segurança, para urgência e tutela antecipada;
- Ação ordinária, para discussão do cálculo e da forma de pagamento.
Requisitos para o reconhecimento do direito adquirido
Para obter êxito, o servidor deve comprovar:
- Documentação que demonstre os quinquênios completados (portarias, declarações de tempo de serviço);
- A ausência de fruição da licença especial por interesse do serviço;
- Data de aposentadoria ou desligamento;
- Requerimento administrativo devidamente protocolado;
- Prova da omissão ou indeferimento do órgão.
O que diz a Portaria Normativa nº 3, de 2018 (Ministério do Planejamento)
Publicada em 05 de julho de 2018, a Portaria nº 3 estabeleceu parâmetros uniformes para a administração federal civil:
- Critérios de elegibilidade para conversão;
- Base de cálculo definida em lei;
- Índices oficiais de correção monetária;
- Prazos para apresentação do requerimento.
Embora dirigida a servidores civis federais, tribunais e juízes vêm aplicando esses mesmos parâmetros por analogia aos regimes estaduais e militares, quando não há norma específica local.
Regramento sobre a conversão em pecúnia
A portaria dispõe:
- Base de cálculo: remuneração básica do cargo + vantagens permanentes que compunham a remuneração no último mês de exercício;
- Dia de licença: computado proporcionalmente, considerando 30 dias como um mês;
- Correção monetária: índice IPCA-E ou outro oficial definido pelo Ministério da Economia;
- Juros de mora: 1% ao mês, contados da data em que cada período deveria ter sido gozado;
- Prazos: protocolo em até 5 anos após a data da aposentadoria ou exoneração.
Aplicação da portaria para servidores civis e militares
Embora o texto fale apenas em “servidores civis federais”, a concepção de direito adquirido e a aplicação dos princípios constitucionais de isonomia levaram tribunais a estender seu alcance. Em ações envolvendo policiais, bombeiros e militares da União e dos Estados, os magistrados têm:
- Adotado o mesmo critério de cálculo;
- Reconhecido correção monetária integral;
- Assegurado juros de mora a partir do primeiro dia subsequente ao afastamento.
Impacto da portaria nos pedidos administrativos
Desde sua publicação, a portaria tornou o processo administrativo mais transparente:
- Redução de recursos internos por clareza nos cálculos;
- Maior celeridade no requerimento e no pagamento;
- Padronização de documentos exigidos;
- Menor espaço para recusas infundadas.
Como solicitar a conversão da licença especial em dinheiro
A conversão administrativa é a via mais célere e menos onerosa. Recomenda-se:
- Analisar o regulamento interno do órgão que concedeu licença;
- Levantar todos os comprovantes de cada quinquênio;
- Calcular o valor aproximado, usando a base de cálculo da portaria;
- Protocolar requerimento formal, com fundamentação legal e jurisprudencial;
- Acompanhar o processo, recorrendo em caso de indeferimento.
Documentos necessários e procedimentos administrativos
Para instruir corretamente o pedido, reúna:
- Requerimento assinado, especificando cada período de licença;
- Portarias ou atos que comprovem a concessão da licença especial;
- Certidão de tempo de serviço, mencionando quinquênios;
- Demonstrativos de remuneração (holerites) da última folha;
- Relatórios ou memorandos que atestem necessidade de serviço que impediu o gozo;
- Protocolos e notificações de eventual indeferimento.
Ação judicial: quando é necessária e como ingressar
Se o pedido administrativo for negado ou silenciado, cabe:
- Mandado de Segurança, visando tutela antecipada para pagamento imediato;
- Ação Ordinária, em caso de discussão de cálculo ou exigência de prova adicional;
- Embargos de Declaração, se houver omissão ou contradição na sentença;
- Recurso no tribunal competente para garantir a correção do valor.
Prazos para requerer e prescrição quinquenal
A legislação federal estabelece prazo de prescrição de cinco anos, contados:
- No caso de inativos, da data da aposentadoria ou exoneração;
- No caso de ativos, do término do último período de licença especial não gozado.
Atenção: ultrapassado esse prazo, o direito não pode mais ser exigido, mesmo que comprovado o direito adquirido.
A conversão da licença especial em pecúnia representa um direito patrimonial do servidor público – civil ou militar – que tenha cumprido os quinquênios antes da EC nº 103/2019. A Portaria Normativa nº 3/2018 detalha cálculos, prazos e índices de correção, conferindo segurança jurídica ao procedimento. Quando a via administrativa falha, o Poder Judiciário se apresenta como instrumento eficaz para assegurar esse direito, já pacificado pelo STF e pelo STJ.
Não deixe de verificar suas portarias e regulamentos internos, apurar cada período de licença especial e protocolar o requerimento com todos os documentos comprobatórios. Caso ocorra indeferimento ou silêncio, a ação judicial – sobretudo o mandado de segurança – é fundamental para garantir o pagamento com correção monetária e juros legais.
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Referências
Dr. Tiago O. Reis, OAB/PE 34.925, OAB/SP 532.058, OAB/RN 22.557
Advogado especializado em ações que envolvem militares há mais de 12 anos, ex-2º Sargento da Polícia Militar e Diretor do Centro de Apoio aos Policiais e Bombeiros Militares de Pernambuco. Atuou em mais de 3039 processos em defesa da categoria, obtendo absolvições em PADs, processos de licenciamento e conselhos de disciplina.
Criou teses relevantes, como o Ação do Soldo Mínimo, Auxílio-transporte, Promoção Decenal da Guarda e Fluxo Constante de Promoção por Antiguidade.
Foi professor de legislação policial e sindicante em diversos processos administrativos. Pós-graduado em Direito Constitucional e Processual, com MBA em Gestão Empresarial, é referência na luta por melhores condições jurídicas e de trabalho aos militares.
Atualmente, também é autor de artigos e e Editor-Chefe no Blog da Reis Advocacia, onde compartilha conteúdos jurídicos atualizados na área de Direito Criminal, Militar e Processo Administrativo Disciplinar, com foco em auxiliar militares e servidores públicos na defesa de seus direitos.



