Universitário é Baleado por PM da Reserva: O Direito à Presunção de Inocência e os Limites da Legítima Defesa
O recente caso envolvendo Igor Melo de Carvalho, estudante universitário baleado por um policial militar da reserva no Rio de Janeiro, reacendeu debates sobre o uso da força, a presunção de inocência e o devido processo legal. Segundo relatos da família, o jovem foi confundido com um assaltante e alvejado enquanto voltava para casa de moto, após o expediente em um bar onde trabalha como garçom.
O episódio levanta questões jurídicas relevantes, principalmente em relação à legítima defesa, abordagens policiais, responsabilização criminal e direitos fundamentais. Como escritório de advocacia, analisamos os aspectos legais desse caso, os direitos envolvidos e os desdobramentos possíveis no âmbito jurídico.
O Direito à Presunção de Inocência
Um dos princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito é a presunção de inocência, prevista no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal:
“Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.”
Esse princípio significa que qualquer indivíduo deve ser tratado como inocente até que haja prova concreta de sua culpa, garantindo-se um julgamento justo. No caso de Igor, a falta de evidências materiais de sua participação em qualquer crime – como o próprio reconhecimento da esposa do PM de que ele não era um dos assaltantes – reforça a importância de não antecipar juízos e evitar injustiças.
A manutenção do estudante sob custódia policial no hospital, sem provas concretas de seu envolvimento em crime, pode configurar ilegalidade e ferir esse direito fundamental.
Legítima Defesa e Uso da Força: O Que Diz a Lei?
O Código Penal Brasileiro prevê a legítima defesa no artigo 25:
“Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.”
Para que a legítima defesa seja reconhecida, é necessário que:
- Exista uma agressão injusta, atual ou iminente – o que significa que a ameaça precisa ser real e imediata.
- Os meios empregados sejam proporcionais – o uso da força deve ser compatível com a ameaça sofrida.
- A reação tenha sido necessária – ou seja, não existiam alternativas menos letais para conter a situação.
No depoimento, o PM da reserva alegou que viu uma arma com Igor, justificando os disparos. No entanto, nenhuma arma foi encontrada, e câmeras de segurança mostram que o estudante apenas pegou uma moto por aplicativo na porta do bar onde trabalha.
Caso fique comprovado que não havia risco iminente à vida do policial ou de terceiros, o uso da força letal poderá ser considerado desproporcional e abusivo, abrindo espaço para responsabilização criminal e civil do autor dos disparos.
Responsabilização Criminal: Quais as Possíveis Consequências?
A depender da conclusão das investigações, o PM da reserva pode ser indiciado e processado criminalmente. Alguns dos crimes que podem ser analisados são:
1. Tentativa de Homicídio (Art. 121 c/c Art. 14, II, do Código Penal)
Se ficar comprovado que Igor não oferecia risco real e que o disparo foi injustificado, o policial pode responder por tentativa de homicídio, uma vez que o estudante sobreviveu ao ataque, mas sofreu graves ferimentos.
2. Lesão Corporal Grave (Art. 129, §1º, do Código Penal)
Caso o Ministério Público entenda que não houve intenção de matar, mas houve dolo na agressão, o PM pode ser responsabilizado por lesão corporal grave, especialmente porque Igor perdeu um rim e sofreu danos significativos em órgãos internos.
3. Abuso de Autoridade (Lei 13.869/2019)
Se for constatado que o PM agiu de forma arbitrária, sem base legal para a abordagem e os disparos, ele pode ser responsabilizado por abuso de autoridade, conforme prevê a Lei 13.869/2019, que pune excessos praticados por agentes públicos.
Aspectos Civis: O Direito à Indenização
Além da esfera penal, há possibilidade de responsabilização civil do PM e do Estado pelo ocorrido.
O artigo 37, §6º, da Constituição Federal, estabelece que o Estado responde objetivamente pelos danos causados por seus agentes no exercício de suas funções:
“As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros.”
Caso fique comprovado que Igor foi vítima de erro na abordagem policial, ele e sua família podem buscar indenização por danos morais, estéticos e materiais.
Discriminação e Racismo Estrutural
A esposa e familiares de Igor afirmaram que ele foi vítima de racismo ao ser confundido com um assaltante, simplesmente por ser um homem negro em cima de uma moto.
O Supremo Tribunal Federal (STF) já reconheceu que práticas discriminatórias e racistas podem agravar situações de violência policial, sendo necessário um combate efetivo a esse tipo de abordagem seletiva.
Se comprovado que a abordagem do PM foi motivada por discriminação racial, há a possibilidade de responsabilização por racismo, que é considerado crime inafiançável e imprescritível no Brasil (artigo 5º, inciso XLII, da Constituição).
O Que Esperar do Caso?
O caso de Igor Melo de Carvalho ilustra a necessidade de rigor na apuração dos fatos e respeito aos direitos fundamentais. As principais questões que devem ser analisadas incluem:
- O policial realmente tinha motivos para acreditar que Igor representava um risco iminente?
- A reação foi proporcional ao suposto risco?
- A manutenção do estudante sob custódia é legal, considerando que não há provas concretas contra ele?
- Houve discriminação racial na abordagem?
A defesa de Igor pode buscar medidas legais para garantir sua liberdade, sua recuperação e sua reparação pelos danos sofridos. O devido processo legal deve ser seguido, e a responsabilização dos envolvidos deve ocorrer de forma justa e transparente.
Se você ou alguém próximo passou por uma situação semelhante de abordagem policial abusiva, erro judicial ou violação de direitos, entre em contato com nossa equipe especializada. Estamos prontos para garantir a sua defesa e buscar justiça pelo seu caso.
Reis Advocacia
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